quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Presidente da Gusa Nordeste é preso no Espírito Santo por participar da Máfia do Carvão


Pesquisa do Observatório Social revela que esquema é parecido com o que ocorre no Pará e Maranhão

O presidente da Gusa Nordeste, Ricardo Carvalho Nascimento foi preso no dia 11 de novembro pelo Núcleo de Repressão às Organizações Criminosas e à Corrupção (Nuroc), no Espírito Santo.
Com negócios ligados à siderúrgica CBF, localizada no município capixaba de João Neiva, o empresário seria responsável, segundo a investigação, pela compra de R$ 107.608.00,00 em carvão vegetal de 16 empresas capixabas e da Bahia, com indícios de irregularidades.
Diante das acusações do Nuroc, Nascimento fazia parte da “Máfia do Carvão” no Norte do Espírito Santo, onde empresas que forneciam milhões de reais em carvão vegetal para a siderúrgica CBF, tinham existência jurídica com documentos falsificados, endereços inventivos e sócios inexistentes.
Conforme apurou o Nuroc, outra irregularidade evidencia que o fornecimento de carvão vegetal em grande proporção para a CBF, não advinha apenas dessas empresas pelos poucos fornos registrados para produção do carvão. Assim, o esquema forçava pequenos e médios produtores capixabas e baianos, a venderem carvão vegetal na ilegalidade, com notas fiscais de determinadas empresas que faziam parte do plano de acobertamento para a siderúrgica CBF.
Prática comum?
Se no sudeste a “Máfia do Carvão” existia há dez anos, segundo apontam as investigações da polícia capixaba, no pólo siderúrgico de Marabá (PA) e Açailândia (MA), onde se encontra a siderúrgica Gusa Nordeste, presidida por Nascimento, parte do carvão utilizado na cadeia de produção do aço proveniente do minério extraído pela mineradora Vale é ilegal e com incidência de trabalho escravo.
É o que contatou a pesquisa divulgada em junho deste ano realizada por Marques Casara, jornalista membro do Observatório Social.
O estudo aponta que há diversas formas de esquemas na operação dos grandes complexos carboníferos usados para lavar carvão ilegal para as siderurgias. Uma das mais emblemáticas reveladas é o caso da Indústria de Carvão Vegetal Boa Esperança situada em Jacundá (PA), de onde controla 96 fornos. “Em março deste ano a empresa declarava ter no pátio 325 MDC* de carvão. A contagem forno a forno, realizada por fiscais do IBAMA mostrou que a empresa só tinha de fato, 113 MDC de carvão. A diferença (212) vinha proveniente de carvoarias clandestinas”,ou seja,“o carvão produzido em outro local usa o crédito da carvoaria legalizada para esquentar o produto e dar a ele uma aparência legal. Somente na Boa Esperança, 66% do carvão declarado pela empresa não está, de fato, no pátio. Com isso, a empresa pode vender 66% dos seus créditos de carvão”, afirma a pesquisa.
Segundo Casara menciona no relatório, a “Boa Esperança faz parte de uma rede de ilegalidade na região de Jacundá e seu proprietário utiliza-se de 15 CNPJs (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica)”.
Em Nova Ipixuna (PA), trabalhadores foram flagrados em carvoaria clandestina sem carteira assinada e sem equipamento de proteção, onde 100% da produção é direcionada ao pólo siderúrgico de Carajás, denunciou o estudo.
  “O carvão é usado para fabricar ferro gusa, posteriormente vendido para grandes pólos siderúrgicos”, revela o jornalista.
O IBAMA do Pará e Maranhão, também suspeita sobre a verdadeira quantidade de eucalipto que dizem ter as siderúrgicas. “Estamos justamente realizando um estudo que nos elucide sobre a verdadeira área plantada de eucalipto na região para podermos fiscalizar a proveniência desse carvão” diz Orlando de Assunção Filho, gerente executivo do IBAMA de Imperatriz (MA).
Destruição 
A Gusa Nordeste é umas das cinco siderúrgicas que compõem o complexo siderúrgico de Açailândia, interior do Maranhão, localizada no bairro conhecido como Piquiá de Baixo, situado às margens da BR 222.
Nessa comunidade, cerca de trezentas famílias lutam para serem removidas para outra localidade com as devidas formas de sociabilidade, pois, desde que o pólo siderúrgico foi implantado, próximo à moradia dessas famílias para atender o Grande Programa de Carajás no inicio dos anos 1980, para produção de ferro gusa, elas convivem com sérios problemas de saúde.
Uma equipe formada pelo Centro de Referências em Doenças Infecciosas e Parasitárias da Universidade Federal do Maranhão, e do Núcleo de Estudos em Medicina Tropical da Pré-Amazônia, realizou um estudo no bairro abrangendo 55% dos domicílios com moradores presentes no momento da visita, ou seja, 90 famílias, onde residiam 409 pessoas, sendo 212 mulheres e 197 homens.
Segundo o relatório das equipes, “o estado geral dos entrevistados era de regular para bom em 86,6% e com sinais de precariedade em 13,4%, ou seja, indivíduos que manifestavam falta de ar, estavam acamados ou eram possuidores de alguma doença degenerativa (diabetes, hipertensão arterial, doença de Parkinson ou doença cardiovascular)”.
Chama-se a atenção que “63,3% referiu ter tido alguma doença anteriormente e 41,1%
doença atual”. Quanto a manifestações orgânicas “as queixas recaíram sobre os pulmões e a pele” revela o estudo.
Ainda foi constatado que as manifestações ligadas ao aparelho respiratório (tosse, falta de ar e chiado no peito) foram queixas encontradas em todas as faixas etárias, inclusive com boa intensidade em menores de 9 anos de idade.

E o mais improvável, cefaléia, encontrada em 61,2% dos pacientes, que segundo a equipe médica “é um sintoma não comum em crianças dessa idade”.
As manifestações de alergia, acometendo as vias aéreas superiores e olhos (coriza e lacrimejamento) foram encontradas em 61,2% dos pacientes.
Sanção 
Para Antonio Filho, advogado do Centro de Defesa da Vida e dos Direitos Humanos Carmem Bascarán, “a siderurgia, em busca de lucros exorbitantes, vai deixando um rastro de destruição, trabalho escravo e uma série de irregularidades no abastecimento de sua principal matéria prima, o carvão”.
O que pode acarretar em sanções judiciais segundo Danilo Chammas, advogado da organização Justiça nos Trilhos, pois, “as siderúrgicas podem ser demandadas judicialmente por sua responsabilidade civil, criminal e também no âmbito trabalhista, posto que são as que se beneficiam diretamente das atividades das carvoarias ilegais e talvez até as estimulem”.
Quanto aos danos ambientais decorrentes diretamente da produção das siderúrgicas, provocando doença na população circundante, Chammas afirma que a responsabilidade civil, criminal e administrativa é clara e decorre de previsão na Constituição Federal.
“Neste caso, como uma pessoa jurídica não pode vir a ser presa, as penas podem ser as seguintes: suspensão total ou parcial das atividades; interdição temporária de estabelecimento, obra ou atividade; proibição de contratar com o Poder Público e de obter subsídios, subvenções ou doações pelo prazo de até 10 anos; sua extinção definitiva, se ficar comprovado que ela foi criada com a finalidade de cometer praticas classificadas como crimes ambientais”,elucida o advogado.
Por fim, a legislação prevê também a possibilidade de desconsideração da personalidade jurídica, ou seja, “que os sócios e diretores respondam pessoalmente e com seu próprio patrimônio pelos atos ilegais cometidos pelas empresas”,conclui Chammas

Por: Márcio Zonta  de Açailândia (MA)
 www.viasdefato.jor.br

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