segunda-feira, 10 de março de 2014

Comunidade quilombola de Jacareí dos Pretos, municipio de Icatu



Quem frequenta, em grande maioria, as reuniões em Jacareí dos Pretos, comunidade quilombola do município de Icatu,são as mulheres. Mulheres jovens e idosas. Donas de casa e trabalhadoras rurais. A dona Lucimar da Conceição Costa participou de várias capacitações sobre meio ambiente. Para ela, a palestra é muito importante para todos os moradores que tenham consciência, pois com a palestra se sabe onde roçar e como queimar os roçados, e não roçar as margens dos rios, caso façam roça os rios vão secar. A dona Heloisa comentou de uma vez em que visitando a beira do rio se surpreendeu com um imenso desmatamento e as juçareiras queimadas. Os seus parentes fizeram o serviço. A área desmatada era de sua avó. A juçara se apresenta como uma das principais fontes de vitaminas para as comunidades tradicionais e Jacareí dos Pretos não é diferente. As juçareiras cobrem todas as margens do rio. Pediu-se que as pessoas escrevessem as espécies frutíferas que podem ser encontradas em Jacareí. Simplesmente, as pessoas se esqueceram de incluir juçara. Antes e durante a oficina de capacitação em meio ambiente, os moradores de Jacareí ressaltavam o quanto as juçareiras tem diminuído. Soa inacreditável que uma espécie tão importante para a alimentação humana e para a conservação dos recursos hídricos como a juçara perca espaço no cotidiano e na memória das pessoas. Sobre isso, uma das moradoras comentou que aqueles que destroem a Juçara destroem a si mesmos e também destroem os demais. A dona Irene tratou desse assunto quando disse que várias pessoas de Jacareí compram juçara de lugares próximos em vez de comprarem na própria comunidade. No dia anterior, a dona Irene amassou sementes de juçara para tirar uns dois litros. Os seus sobrinhos menores repetiram inúmeras vezes depois que começaram a beber. Ela não jogou fora ou em qualquer lugar as sementes de juçara. Próximo a sua casa existe uma área que enche de água em tempo de chuva e nesse lugar ela distribuiu a semente. Os moradores de Jacareí são bem informados com relação a vários assuntos, entre os quais meio ambiente e produção. Eles acolhem as informações, mas acolhem tão bem que essas informações ficam guardadas no seu intimo. As mulheres participaram de capacitações de todo o tipo. O problema é que elas e eles não põem em prática. Os moradores desmatam para roçar uma área ou para tirar madeira e ninguém se preocupa em reflorestar a área. Houve uma época em que gente de tudo quanto é lado entrava em Jacareí para cortar madeira e sem pedir permissão para a comunidade. Essa terra não tem dono, é de todo mundo, alguns repetem. A partir do momento em que o Incra e o Aconeruq começaram a repassar informações sobre a questão ambiental e a questão fundiária, essa realidade mudou. Com conflitos, é claro. Um morador cortou algumas árvores e quando estava pronto para busca-las comunicou o seu Janjão, presidente da associação. O seu Janjão comunicou que a madeira seria utilizada na construção de uma estrutura para receber uma criação de galinha caipira e uma horta. Ele viu a experiência num assentamento do município de Barreirinhas e se animara. O morador que derrubou as arvores argumentou, mas não houve jeito. Na reunião da associação, no segundo domingo do mês, outro morador pediu varas e mourões para fazer um curral a fim de pescar. A direção questionou o fato de que só desse jeito para ele aparecer em uma reunião e que ele e os outros moradores de São Raimundo, povoado localizado no território de Jacarei, não movem um dedo para impedir o desmatamento ilegal em algumas áreas do território quilombola. Alguns moradores ainda acham que podem roçar e queimar as cabeceiras das fontes de água. Os moradores se mostram indignados pela situação de uma das principais fontes. As mães se cansaram de dizer aos filhos para não irem para o meio da fonte. Qual foi a mãe que não fez isso em algum momento da sua vida? As crianças e os jovens perderam o medo da água. Os menores se mandam sozinhos para as fontes.Com os desmatamentos das margens e das áreas de captação, o nível das fontes diminuiu. Além disso, as pessoas usam a água para todos os fins, principalmente, lavar roupa e nessa utilização largam roupas velhas e recipientes de plásticos. O lixo vai se acumulando. As mulheres de Jacareí, depois de uma palestra do SENAR, formaram grupos de meio ambiente para recolher o material que as pessoas deixam próximo e dentro das fontes de água. A dona Natalina saiu de sua casa para falar um pouco da situação da principal fonte de Jacareí. Ela tinha acabado de chegar de lá onde lavara sua roupa. Para o uso doméstico ela se vale da água do poço construído por sua irmã. A lembrança da água de boa qualidade ressurge. Era uma água azul. Os moradores de Jacareí não se defrontam com falta de água como acontece com outras comunidades e com outros municípios do Maranhão e do Brasil. Entretanto, os invernos entre 2012 e 2013 foram fracos. A diminuição do regime das chuvas acarreta a diminuição do volume da água nas fontes. Explicou-se que a mudança de clima que eles sentem na falta de chuvas decorre do modelo de produção que a humanidade implanta desde os primeiros anos de sua existência e que mais, recentemente, intensifica-se com o maior consumo de carne e de combustíveis fosseis. O consumo de carne de gado e de combustives fosseis fazem com que as pessoas se vejam de e vejam os outros de forma diferente. Algum dia, o ser humano já foi coletor de frutas. Deixou de ser coletor para se tornar lavrador e carnívoro e assim começou a desmatar e a urbanizar o planeta. A juçara é a principal fruta da comunidade de Jacareí dos pretos. Existem muitas outras como o murici, a bacaba, a mangaba, o bacuri. A Marcia, sobrinha de dona Irene e de seu Janjão vende a polpa de murici. Ela notou as frutas se estragavam no chão e isso a motivou a querer aproveitar o murici. Um dia antes da oficina de capacitação, ela enviou vários quilos de polpa para seus parentes em São Luis. O que falta mesmo é um freezer para guardar a polpa.    Ela mora na comunidade desde os primeiros anos. A mãe de dona Irene e de seu Janjão pediu a mãe de sangue que a criasse. Perguntaram a Marcia o significado de ser quilombola. Ela respondeu que não era quilombola. Como não, estranharam os demais. A comunidade de Bom Sucesso onde Marcia nasceu é comunidade quilombola. A resposta de Marcia mostra a distancia que existe entre os jovens e os conhecimentos tradicionais.      

  Mayron Régis

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