terça-feira, 30 de setembro de 2014

Comunidade de São Raimundo é vitoriosa

Costa Pinto sofre derrota

Comunidade Brejinho da Onça II obtem vitoria no TJ

segunda-feira, 29 de setembro de 2014

Decisão de Tribunal Regional Federal proibe atividade de mineração no rio Munim

AGRAVO DE INSTRUMENTO N. 0054247-72.2014.4.01.0000/MA (d)
Processo Orig.: 0024390-36.2014.4.01.3700
R E L ATO R : DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE
AGRAVANTE : PORTO DA CASCA MINERACAO LTDA
ADVOGADO : ANTONIO FERNANDES CAVALCANTE JUNIOR
ADVOGADO : TESSIA VIRGINIA MARTINS REIS
AGRAVADO : MINISTERIO PUBLICO FEDERAL
DECISÃO
Cuida-se de agravo de instrumento, com pedido de efeito suspensivo, interposto contra decisão
proferida pelo juízo da 8ª Vara Federal da Seção Judiciária do Estado do Maranhão, nos autos
da ação civil pública ajuizada pelo Ministério Público Federal contra MAGROPEL - MAERIAL
DE CONSTRUÇÃO E AGROPECUÁRIA LTDA (atualmente, PORTO DA CASCA MINERAÇÃO
LTDA.) e o Estado do Maranhão, em que se busca a concessão de provimento judicial, no
sentido de que seja declarada a responsabilidade civil decorrente pelo dano ambiental causado
pelo exercício irregular de atividade de extração de substância mineral.
O juízo monocrático deferiu o pedido de antecipação da tutela formulado nos aludidos autos,
nestes termos:
"Trata-se de Ação Civil Pública ajuizada entre partes MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL (autor)
e MAGROPEL - MATERIAL DE CONSTRUÇÃO E AGROPECUÁRIA LTDA. e ESTADO DO
MARANHÃO (réus), qualificadas (fl. 03), que objetiva o reconhecimento de responsabilidade
civil decorrente de dano ambiental provocado pelo exercício de atividade de extração de
substância mineral de forma irregular.
Em síntese, sustenta a prática - pela primeira ré - de extração irregular de substância mineral,
sobretudo devido ao descumprimento de condicionantes ambientais e à falta de observância do
plano de lavra aprovado pelo Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM; a atividade
está sendo exercida no leito e nas margens do Rio Munim, no Município de Presidente
Juscelino, neste Estado, e tem resultado em diversos danos ao meio ambiente.
Pede o deferimento da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicionai para determinar: 01. a
suspensão imediata de qualquer atividade de lavra ou mesmo a retirada de produtos minerais
e a circulação de veículos de transporte de areia, como caçambas pás carregadeiras, diretamente
ou por terceiros, com quem mantenha relação contratual de qualquer espécie, sob
pena de multa ou de apreensão de todos os equipamentos utilizados para o desempenho da
atividade, inclusive veículos, se a multa não for suficiente para a paralisação da exploração do
minério; 02. a suspensão das licenças ambientais concedidas pelo Estado do Maranhão em
benefício do empreendimento, ou de sua renovação.
Inicial instruída com documentos (fls. 20/88).
Resposta preliminar apresentada fora do prazo (fls. 93, 94/153 e 154).
É o relatório.
Primeiramente, cumpre esclarecer que, embora tenha sido extemporânea a apresentação da
resposta preliminar do Estado do Maranhão, os documentos juntados esclarecem aspectos
referentes à omissão atribuída à autoridade administrativa ambiental pela parte autora; podem,
portanto, ser levados em consideração no exame do pedido de antecipação dos efeitos da
tutela jurisdicional.
Passo à apreciação do pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional.
O primeiro de seus requisitos - prova inequívoca conducente à verossimilhança das alegações,
consistente, em linhas gerais, na aproximação entre os juízos de probabilidade (cognição
sumária) e de certeza (cognição exauriente) - está parcialmente presente, ao menos a princípio,
na medida em que parte da prova documental que instrui a inicial indica que a co-ré
MAGROPEL - MATERIAIS DE CONSTRUÇÃO E AGROPECUÁRIA Ltda. mantém atividade de
extração de minério em desconformidade com o título autorizativo expedido pelo Departamento
Nacional de Produção Mineral -DNPM.
Nesse sentido, observo que o Relatório de Fiscalização n. 09/2014-SUP/MA aponta irregularidades
na exploração do minério, com a realização de lavra em local diferente do estabelecido
na licença de operação e fora da poligonal do título autorizativo; ficou constatado,
ainda, que a exploração ocorre com método de lavra e produções diferentes do aprovado pelo
DNMP (fls.67/72).
Diante disso, a autoridade administrativa (DNPM) lavrou o Auto de Paralisação n. 0051/2014 e
o Termo de Interdição n. 01/2014 em desfavor da primeira demandada (sociedade empresária),
além de ter expedido a Notificação n. 0008 a fim de que ela observe o plano de lavra aprovado
(fls. 75/77).
As irregularidades apontadas pelo DNPM, longe de se restringirem ao dano financeiro à União
(CF, art. 20 inc. IX), demonstram a existência de impacto ambiental negativo resultante do
empreendimento, pois, conquanto a petição inicial esteja acompanhada de cópia das licenças
ambientais e do registro de licença, há indicação de que a atividade de exploração de minério
é exercida em desconformidade com o que foi autorizado.
Reforça essa conclusão o relatório técnico elaborado pelo Ministério Público Federal, que
indica a existência de riscos à integridade ambiental decorrentes da extração de minério em
área de preservação permanente - margens do Rio Munim. De acordo com o analista pericial,
com base nos dados de localização geográfica apresentados pelas autoridades administrativas
(SEMA e DNMP), é possível concluir que alguns pontos referentes à lavra mineral estão em
Área de Preservação Permanente - APP, a exemplo da frente de lavra identificada na figura
como PT 40 (fI, 81), que está fora do polígono autorizado pelo DNMP; a exploração é prejudicial
ao ecossistema, por remover a cobertura vegetal, que funciona como barreira natural
contra erosão do solo e posterior assoreamento do rio (fls. 80/82).
Noutro giro, apesar de a entidade responsável pelo licenciamento ambiental ter se manifestado
tardiamente, ela apresentou o Relatório de Vistoria/Fiscalização (fls. 116/120) - em atendimento
à Recomendação n. 05/2014 elaborada pelo Ministério Público (Federal e o Estadual) -, no qual
ficou constatado que a primeira ré não estava respeitando o limite da área de preservação
permanente, tampouco a condicionante n. 11 da Licença de Operação n. 448; em conseqüência,
foram lavrados o Auto de Infração n. 301/A (fI. 114) e o Termo de Embargo n. 1219
(fI. 113).
Posteriormente, foi celebrado entre a Secretaria de Estado do Meio Ambiente e Recursos
Naturais e a pessoa jurídica MAGROPEL o Termo de Compromisso Ambiental n. 01/2014, com
o objetivo de desembargar a atividade de mineração (fls. 146/152).
Em 14.05.2014, foi expedido o Termo de Desembargo n. 01/2014 (fI. 153)
Nesse contexto, para além de o Estado do Maranhão (SEMA) ter apresentado elementos a
indicar o exercício do seu dever poder de polícia - ainda que provocado pelo Ministério Público
-, a continuidade da fiscalização do empreendimento é medida que se impõe, de modo que
compete ao ente estatal o seu efetivo monitoramento, sob pena de eventual reexame do pedido
de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional e suspensão dos efeitos das licenças ambientais,
Sobreleva enfatizar, contudo, que a não suspensão dos efeitos das licenças expedidas pela
autoridade ambiental (SEMA) não permite a continuidade da exploração da área pela co-ré
MAGROPEL, na medida em que a atividade foi realizada em descompasso com o título
autorizativo - expedido pelo DNMP - o que acarretou, inclusive, a lavratura do Auto de Paralisação
n. 0051/2014 (fl. 75).
Já a urgência se justifica pelo fato de que a continuidade da atividade de exploração representa
grave e fundado risco de danos de difícil ou impossível reparação ao aspecto natural do meio
ambiente diante da extração irregular e clandestina de minério.
Com tais considerações, DEFIRO PARCIALMENTE o pedido de antecipação dos efeitos da
tutela jurisdicional para DETERMINAR a suspensão de quaisquer atividades de lavra ou mesmo
retirada de produtos minerais por MAGROPEL MATERIAL DE CONSTRUÇÃO E AGROPECUÁRIA
LTDA, bem como de circulação de veículos de transporte de areia - por si ou por
terceiros sob sua direção ou orientação.
FICA, portanto, proibida qualquer forma de atividade de lavra, retirada ou beneficiamento de
minério.
FIXO multa diária no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais), em caso de descumprimento.
A multa fixada não impede a adoção das medidas indispensáveis a garantir o cumprimento
desta decisão (busca e apreensão, prisão remoção e apreensão de pessoas e coisas, impedimento
de atividades nocivas, indisponibilidade de bens e valores), se necessário, com
requisição de força policial.
Poderão o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis - IBAMA
e o Departamento Nacional de Produção Mineral - DNPM se manifestar sobre eventual interesse
em integrar a relação processual (Lei 7.347/85, art. 5º, p. 2º).
Encaminhe-se cópia dos autos ao Departamento de Polícia Federal - DPF para apuração de
eventual responsabilidade criminal à vista da possibilidade de ter havido autorização de lavra
em área sob regime de especial proteção ambiental e em desacordo com o plano de lavra
concebido, conforme se observa de parte do Relatório de Fiscalização n. 09/2014-SUP/MA - ("a
concepção do Plano de Lavra foi toda baseada para executar uma lavra no leto (sic) do Rio
Munim, porém a poligonal do título autorizativo está na margem do referido rio, além disso
parte da área está em APP" - fl. 68)".
Em suas razões recursais, sustenta a recorrente, em resumo, a regularidade da extração
mineral em referência, na medida em que seria detentora de regular autorização e licenciamento
ambiental pelos órgãos competentes; a exploração mineral em referência estaria
dentro da poligonal autorizada pelo Departamento Nacional da Produção Mineral, em área
própria para mineração, conforme licenciamento ambiental e Plano de Recuperação de Área
Degradada - PRAD por ela apresentado, em cumprimento ao que restou acordado em Termo
de Compromisso Ambiental - TCA. Acrescenta, ainda, que, na espécie, por se tratar de
atividade de utilidade pública e de interesse social, nos termos da legislação de regência, não
poderia ser paralisada, eis que é essencial ao desenvolvimento da região e estaria de acordo
com o princípio da função social da propriedade mineral e do livre acesso aos recursos
minerais.
***
Não obstante os fundamentos deduzidos pela recorrente, não vejo presentes, na espécie, os
pressupostos do art. 558 do CPC, a autorizar a concessão da almejada antecipação da tutela
recursal, na medida em que não conseguem infirmar as lúcidas razões em que se amparou a
decisão agravada, as quais se afinam com a tutela cautelar constitucionalmente prevista no art.
225, § 1º, V e respectivo § 3º, da Constituição Federal, na linha auto-aplicável de imposição ao
poder público e à coletividade o dever de defender e preservar o meio ambiente ecologicamente
equilibrado, como bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de
vida, para as presentes e gerações futuras (CF, art. 225, caput), tudo em harmonia com o
princípio da precaução.
Há de ver-se, porém, que, em homenagem à tutela ambiental acima referida, ações agressoras
do meio ambiente, como a noticiada nos autos de origem, devem ser rechaçadas e inibidas,
com vistas na preservação ambiental, em referência. Na espécie dos autos, contudo, a ação
agressora, que já se operou, e o conseqüente dano ambiental, que já se materializou, não
afastam as medidas de cautelas necessárias, a fim de evitar-se o agravamento desse dano
ambiental, sem descurar-se das medidas de total remoção do ilícito ambiental, na espécie, bem
assim, da tutela de precaução, para inibir outras práticas agressoras do meio ambiente, mormente
em se tratado de área de proteção permanente, como no caso.
Há que se ressaltar, ainda, que a área descrita nos autos encontra-se situada nos limites da
Amazônia Legal, patrimônio nacional, nos termos do art. 225, § 4º, da Constituição Federal,
inserida, assim, em área de especial proteção ambiental, competindo ao Poder Legislativo,
dentro dos princípios constitucionais que regem o exercício do direito de propriedade, estabelecer
normas, limitando ou proibindo o exercício de atividades que ameacem extinguir, em
área legalmente protegida, as espécies raras da biota regional, sujeitando-se o infrator ao
embargo das iniciativas irregulares, tais como a medida cautelar de apreensão do material e
das máquinas usadas nessas atividades, com a obrigação de reposição e reconstituição, tanto
quanto possível, da situação anterior e a imposição de multas (Lei nº 6.902/81, art. 9, d, e
respectivo § 2º), sem prejuízo da apuração da responsabilidade criminal, eis que tal fato
constitui, em tese, os ilícitos ambientais previstos nos arts. 48 e 50-A da Lei nº 9.605/98, que
assim dispõe:
Art. 48. Impedir ou dificultar a regeneração natural de florestas e demais formas de vegetação:
Pena - detenção, de seis meses a um ano, e multa.
Art. 50-A. Desmatar, explorar economicamente ou degradar floresta, plantada ou nativa, em
terras de domínio público ou devolutas, sem autorização do órgão competente:
Pena - reclusão de 2 (dois) a 4 (quatro) anos e multa.
Não cabe invocar-se, aqui, categorias jurídicas de direito privado, para impor a tutela egoística
da propriedade privada, a descurar-se de sua determinante função social e da supremacia do
interesse público, na espécie, em total agressão ao meio ambiente, que há de ser preservado,
a qualquer custo, de forma ecologicamente equilibrada, para as presentes e futuras gerações,
em dimensão difusa, na força determinante dos princípios da prevenção e da participação
democrática (CF, art. 225, caput).
Na ótica vigilante da Suprema Corte, "a incolumidade do meio ambiente não pode ser comprometida
por interesses empresariais nem ficar dependente de motivações de índole meramente
econômica, ainda mais se se tiver presente que a atividade econômica, considerada a
disciplina constitucional que a rege, está subordinada, dentre outros princípios gerais, àquele
que privilegia a "defesa do meio ambiente" (CF, art. 170, VI), que traduz conceito amplo e
abrangente das noções de meio ambiente natural, de meio ambiente cultural, de meio ambiente
artificial (espaço urbano) e de meio ambiente laboral (...) O princípio do desenvolvimento
sustentável, além de impregnado de caráter eminentemente constitucional, encontra suporte
legitimador em compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro e representa
fator de obtenção do justo equilíbrio entre as exigências da economia e as da ecologia,
subordinada, no entanto, a invocação desse postulado, quando ocorrente situação de conflito
entre valores constitucionais relevantes, a uma condição inafastável, cuja observância não
comprometa nem esvazie o conteúdo essencial de um dos mais significativos direitos fundamentais:
o direito à preservação do meio ambiente, que traduz bem de uso comum da
generalidade das pessoas, a ser resguardado em favor das presentes e futuras gerações"
(ADI-MC nº 3540/DF - Rel. Min. Celso de Mello - DJU de 03/02/2006)".
Com estas considerações, indefiro o pedido de antecipação da tutela recursal formulado na inicial.
Intime-se o agravado, nos termos e para as finalidades do art. 527, V, do CPC, abrindo-se
vistas, após, à douta Procuradoria Regional da República, na forma regimental.
Publique-se.
Brasília, 25 de setembro de 2014.
Desembargador Federal SOUZA PRUDENTE
Relator

Tese atesta viabilidade industrial da mangaba

Estudo da FEA demonstra que fruta tem alto rendimento em polpa.

Em 2012, as exportações brasileiras de frutas frescas totalizaram US$ 619 milhões, representando um volume de 693 mil toneladas. Um dos destinos? O mercado de sucos prontos que, apesar de estar em constante ascensão no Brasil, ainda traz limitação de sabores nos supermercados. A alimentação saudável e a inserção da mulher no mercado de trabalho são apontados como os principais fatores que justificam este crescimento. Na União Europeia, o mercado de sucos de frutas e néctares registra retração desde 2009, devido à precariedade da situação econômica na zona do euro, com a inflação e o desemprego.

A mangaba (Hancornia speciosa Gomes) é um fruto do Cerrado brasileiro com características sensoriais excelentes, mas ainda o seu consumo é pouco difundido no país. A comercialização aos poucos está se despontando, porém com base na informalidade – em geral à margem das rodovias brasileiras e em feiras livres. Mas vem uma reação: os extrativistas do Cerrado começam a se organizar em cooperativas, pois lá quase toda a produção (segundo o IBGE, 722 mil toneladas em 2010) ainda provém do extrativismo.

Um estudo de doutorado da Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA) revelou que essa fruta tem características muito atrativas para o setor agroindustrial. Primeiro porque apresentou alto rendimento em polpa (77%) e segundo pela boa estabilidade física, principalmente quando o assunto é o néctar.

A bebida não tem separação de fases, o que é comum nos néctares de outras frutas, que até informam o consumidor na embalagem com o termo “agite antes de beber”. “É uma boa opção para aumentar o período em que a fruta permanece adequada para consumo”, constatou a engenheira de alimentos Danielle Godinho de Araújo Perfeito, autora da tese, orientada pelo docente da FEA Flávio Luís Schmidt.

Segundo a pesquisadora, quando o fruto está perto do seu máximo desenvolvimento, desprende-se da árvore e completa o amadurecimento no chão (frutos “de caída”), entre 12 e 24 horas. São os frutos mais valorizados. “Mas é preciso muita experiência para saber a hora exata da colheita.”

Por ser tão perecível, a mangaba é destinada, em geral, à indústria, normalmente sendo usada, além de no preparo de sucos, também de sorvetes, doces e bebidas. Quando madura, precisa ser consumida rapidamente, uma vez que isso pode ser um empecilho a sua comercialização. Por isso, a maior parte da colheita é feita no pé, e o fruto pode ser consumido em dois a quatro dias.



Peculiaridades

A pesquisadora investigou a mangaba (palavra de origem indígena que significa “coisa boa de comer”, também conhecida como mangabiba, mangaíba, fruta-de-doente) –, originária de regiões de vegetação aberta como o Cerrado e a Caatinga, muito apreciada pelo seu aroma e sabor, associado ao elevado valor nutritivo.
 
Tem cor amarelada, formato arredondado e chega a medir 6 cm. A mangabeira é uma planta arbórea de porte médio que atinge de cinco a dez metros de altura.
O Cerrado abrange uma área de 204 milhões de hectares, distribuídos especialmente nos Estados de Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Tocantins, Bahia, Piauí, Maranhão e Distrito Federal. Lá ocorre uma florada pequena em junho e outra grande em novembro, mas apenas uma safra de frutos por ano, no período de outubro a dezembro.
A doutoranda conta que começou a desenhar a sua pesquisa ao observar que a mangaba era muito comum na sua região – em Goiânia – e que eram escassos os estudos de tecnologias adequadas ao processamento das espécies nativas na região.
Em sua opinião, conhecer as propriedades químicas e tecnológicas da mangaba ajuda a fornecer uma ferramenta para a criação de novos produtos, favorecendo o desenvolvimento sustentável, “visto que compreende não somente a conservação do meio ambiente, mas também a melhoria dos aspectos sociais e econômicos da população local”.
Estudos sobre as características físicas e químicas dos frutos da mangabeira do Cerrado, além do processamento, são alternativas para garantir a disponibilidade do fruto na entressafra e difundir o consumo.
“Os frutos da mangabeira possuem grande potencial de mercado, uma vez que a sua oferta não consegue atender a demanda encontrada”, garantiu. Sua polpa pode ser consumida in natura e ainda ser empregada para industrialização de doces, geleias, compotas, vinho, vinagre, entre outros produtos.
O setor frutícola do Brasil, comentou a doutoranda, é um dos poucos com área disponível e diversidade de frutas para atender ao crescimento da demanda externa por frutas e derivados.

Processo
Após lavagem, a mangaba segue direto para despolpamento. Como os frutos maduros apresentam casca muito fina e a polpa mole, o processo de despolpa é feito pela maceração do fruto e o seu peneiramento. Ao néctar, além do conteúdo necessário do fruto, são adicionados água e açúcares para sua formulação, bem como ácidos e vitaminas.
A tese de Danielle envolveu a caracterização física e química da mangaba in natura e a avaliação de diferentes processos de extração da polpa. Ela também buscou caracterizar a polpa, elaborar um néctar de mangaba e testar sua estabilidade física.
A pesquisadora quantificou compostos fenólicos e determinou atividade antioxidante in vitro dos frutos, polpa e néctar de mangaba. Outra tarefa que lhe coube foi avaliar sensorialmente bebidas à base de mangaba em diferentes potenciais mercados consumidores e analisar a viabilidade econômica de uma unidade processadora de néctares de frutos nativos do Cerrado.
O estudo das características dos frutos em três diferentes estágios de maturação (verde, semimaduro e maduro) revelou que as mangabas do Cerrado apresentaram uma ligeira mudança de coloração no estágio maduro, o que possibilitou a verificação da maturidade com maior exatidão pelos parâmetros de textura e teor de sólidos solúveis.
Danielle propôs uma maneira diferente de incorporação da polpa de mangaba em bebidas (na forma de esferas em suspensão). Essas bebidas, com “bolinhas” de polpa de mangaba espalhadas pelo líquido, tiveram boa aceitação  e, dentre os consumidores, 63% opinaram positivamente quanto à intenção de compra, algo significativo.

Viabilidade
Na tese, a doutoranda fez um estudo de uma Unidade Produtora de Néctar de Frutos do Cerrado e, pela análise de fluxo de caixa, essa unidade sinalizou viabilidade econômica com taxa interna de retorno (TIR) de 39,54% para um projeto sem financiamento e de 83,02% para um projeto com financiamento.
Nos dois estudos, os valores da TIR foram superiores às taxas de juros vigentes para implantação de projetos agroindustriais, o que torna o projeto bastante convidativo.
Na avaliação do tempo decorrido entre o investimento inicial e o momento no qual o lucro líquido acumulado se iguala ao valor desse investimento (o payback), o projeto com financiamento foi mais vantajoso com payback de dois anos e quatro meses.
O estudo provou que a instalação da Unidade Produtora de Néctar é promissora e que pode fortalecer a economia local, gerar empregos diretos e indiretos, e aumentar a arrecadação e a sustentabilidade ambiental.
A pesquisa da doutoranda foi realizada entre 2010 e 2012, empregando frutos da safra de 2010 oriundos do Cerrado goiano, em sua maioria doados pela Estação Experimental da Universidade Estadual de Goiás, na Unidade Universitária de Ipameri.

SE é o maior Produtor
Nas décadas de 1980 e 1990, vários Estados apareciam na lista do IBGE como produtores de mangaba, como Pernambuco, Piauí, Pará, Mato Grosso, Ceará, Goiás, Mato Grosso do Sul, Maranhão e Rio de Janeiro, porém não houve mais registros nos anos seguintes. Atribui-se esse fenômeno ao pouco uso da fruta na maioria desses Estados e ao desaparecimento de áreas naturais de ocorrência onde se praticava o extrativismo.
Em Sergipe, maior produtor de mangaba do país, a coleta da mangaba é realizada tradicionalmente por mulheres, que se revezam entre essa atividade e a pesca do siri, ostra, sururu. A fruta, em muitos casos, significa a sobrevivência de centenas de famílias. Hoje, o projeto Catadoras de Mangaba, viabilizado pela Petrobras, está percorrendo longos caminhos, por entre areias escaldantes, e atravessando mais cercas para ganhar acesso às mangabeiras e aos seus frutos.

Publicação
Tese: “Processamento da polpa de mangaba (Hancornia speciosa Gomes)”
Autora: Danielle Godinho de Araújo PerfeitoOrientador: Flávio Luís SchmidtUnidade: Faculdade de Engenharia de Alimentos (FEA)

Fonte: Jornal da Unicamp

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

PPA: Planejamento como farsa


O projeto Avança Brasil, idealizado, discutido e posto em prática durante o governo FHC e que abrangia áreas de energia, transporte e agricultura, estava correlacionado com os altos índices de crescimento que a economia norte-americana desenvolveu entre os anos de 1995 e 2001. Em um artigo recente, na carta capital, o economista Luiz Gonzaga Belluzzo cita uma afirmação do economista Stephen Roach, do Morgan Stanley: "Nos sete anos, encerrados em 2001, a economia americana foi responsável por cerca de 63% do crescimento acumulado do PIB mundial." Em um outro trecho, com suas próprias palavras, Belluzzo coloca que a expansão da economia global, nos anos 80 e 90, se deveu a duas polaridades: os Estados Unidos que, por possuírem a moeda-base de troca da economia, expandiram de forma quase ilimitada as suas capacidades de emissão de moeda e de endividamento externo e a China que, graças a investimentos externos e estratégias de crescimento mercantilistas, vem desenvolvendo a sua indústria de maneira acentuada, ano após ano. Entre essas duas polaridades, o Brasil foi inserido por carregar, dentro de si, vasto material de biodiversidade, material humano e material econômico que poderia alimentar os fornos da economia mundial. Só foi preciso, então, investir em infra-estrutura para poder sustentar e expandir os setores voltados para exportação. Para isso contaram com apoio do BID, Banco Mundial e outros bancos de investimento que, por que tinham acesso ao dólar por um baixo custo, fizeram muitos empréstimos para países como o Brasil. Contudo, essa lógica foi montada em cima da crise financeira do estado brasileiro, que, mesmo com apoio externo, se mostrou, e ainda se mostra, permanente. Em uma entrevista, para a mesma Carta Capital, a economista Maria da Conceição Tavares chega a afirmar que "os EUA não puxam ninguém, a não ser o comércio asiático", mas, durante o boom da economia americana (1995-2001), se tinha a firme certeza de que a economia brasileira atingiria um crescimento de 4% ao ano, o que nos levaria a investir cada vez mais em infra-estrutura, no caso hidrelétricas, termelétricas e gasodutos, para suprir as demandas de consumo interno e as demandas para exportar cada vez mais, quer seja eletro-intensivos, quer seja soja. Muitos achavam e ainda acham que a expansão desses setores infinitamente é sinal de pujança, que suas conseqüências mais imediatas são o impulso da economia, como se houvesse uma relação de causa e efeito nas relações estruturais da economia, e que há espaços e recursos para mais investimentos e para serem criadas áreas de reserva e de proteção ambientais e indígenas, que seriam e são pensadas como formas seguras, nem tanto, às vezes, para que sejam preservadas a biodiversidade e as riquezas minerais que lá se encontram. No entanto, a lógica dos setores exportadores, citados anteriormente, não é dar impulsão à economia de maneira geral e sim gerar divisas para cobrir déficits no balanço de pagamentos, pois são setores que não agregam valor e nem geram muitos empregos. Para Eliézer Batista, figura-chave e referência do pensamento nacional desenvolvimentista nas últimas décadas, o Avança Brasil foi a melhor inovação na área de gestão de recursos públicos, mas que se perdeu por tentar conciliar na sua prática a lógica econômica, da onde se originou o projeto, com várias outras lógicas, tipo fatores sociais, econômicos e tecnológicos. Em outra vertente, essas interligações, que, na ótica de Eliézer, eram um sinal de distanciamento das intenções originais do Avança, motivaram severas críticas das ONG’s, movimentos sociais, entidades representativas de classe, nações indígenas e pesquisadores por levarem em consideração tudo, menos, os impactos diretos e indiretos que tais projetos ocasionam antes, durante e depois de sua implantação. A crítica das ONG’s ao Avança era em relação ao modelo e as várias formas que ele se apresentava dentro da e perante a realidade e à sociedade brasileiras. Uma dessas formas em que o Avança se apresentava, e que ainda continua permeando o processo de implantação dos grandes projetos no Brasil, era a da não-discussão com a sociedade civil organizada e a sonegação de informações, como se não fosse de direito o acesso às informações que o projeto tem, só pelo simples fato de que ele é privado ou é público. O ano de 2002 é um dos pontos altos na construção de um modelo teórico-crítico e de articulações que se contraponham a essas práticas, sendo um dos marcos iniciais o encontro da Rede Cerrado, em Goiânia, quando se reuniram organizações não-governamentais "...para discutir estratégias da sociedade civil para as bacias dos rios Araguaia e Tocantins". Em documento da Rede Cerrado, articulação de ONG’s, sindicatos e associações que trabalham pelo bioma Cerrado, justificou-se o motivo dessa reunião pela "...constatação de que os processos de degradação social e ambiental causados pelo atual modelo de desenvolvimento podem ser agravados...". O agravamento levaria a mais perda de solo que está em torno de 4,5 bilhões de dólares, mais perdas das famílias, como as que moram em Balsas, das suas terras para a expansão da soja e o aumento de bancos de areia no canal fluvial do rio Araguaia. A dona Raimunda Martins, artesã da cidade de Araguacema, situada à beira do rio Araguaia, inicia o seu testemunho, também para o encontro da Rede Cerrado, com uma pequena frase sobre como ela e os outros compreendiam e sentiam esse rio: "O Araguaia era fonte de vida...". Quer dizer, não é mais o local onde as pessoas podem coletar os seus alimentos, pois no máximo você pode encontrar uma ou outra espécie de peixe. Podemos dizer que as discussões estabelecidas durante o encontro da Rede Cerrado, uma pena que, no encontro de 2003, a rede não pôde manter a seqüência de discussões sobre grandes projetos, e, logo após, durante os outros encontros que vieram a acontecer, como a dos Rios Vivos, também em Goiânia, desembocaram no encontro da bacia Araguaia-Tocantins, na cidade de Imperatriz, no começo de dezembro de 2002. Dando uma olhada nas deliberações de cada encontro, podemos observar que eles estavam muito próximos uns dos outros. Só citando algumas estratégias construídas durante o encontro da Rede Cerrado: Promover a participação de atores na construção de modelos alternativos; cuidar para que instrumentos legais de participação não sejam utilizados para validar empreendimentos de impacto ambiental; priorizar a informação como instrumento para preparar as pessoas; conter a exportação de produtos eletro-intensivos e desenvolver campanhas na área de energia alternativa. Esses são elementos que as ONG’s priorizaram como forma de iniciar uma discussão que venha estabelecer novos pressupostos para um possível modelo de desenvolvimento para o Brasil. A apresentação desses elementos também seria uma forma de influir no planejamento que o antigo governo tinha e no planejamento que o atual governo teria, dentro da idéia de que os erros do passado não deveriam ser repetidos no futuro. Sim, passado o Avança, o presente agora é o PPA (Plano Plurianual), que foi apresentado, defendido e que se pretende ser um modelo mais "avançado" frente ao anterior, pois a sociedade civil, o setor produtivo e o setor governamental foram convocados a se sentar na mesma mesa para defender suas propostas. Em tese e na prática, o que se viu foi exatamente essa mesa redonda entre os diversos setores, contudo, analisando a sua filosofia, veremos que o PPA é apenas uma cópia mal-feita ou um arremedo do que era o Avança. O próprio Eliézer Batista afirma que o modelo de antes foi estendido para o atual, mas, ao nosso ver, sem a mesma conjuntura econômica que permitia ao governo FHC vender uma imagem de Brasil desbravador e em crescimento. O setor de energia é exemplar nessa sensação de algo que já foi visto e que voltou sem muita razão aparente. Citando dois casos específicos e mais próximos: as hidrelétricas de Estreito e Peixe Angical, no rio Tocantins. Lendo o roteiro do Ministério do Planejamento, vemos que as duas UHE’s estão inseridas nos projetos parceria público-privado e que pleiteiam empréstimos ao BNDES para darem início ou prosseguimento às obras. O problema é que nenhuma das duas tem licenças ambientais asseguradas e os pedidos de empréstimos vão ter que esperar na fila, pois a expansão de Tucuruí tem prioridade. Com relação a UHE de Peixe Angical, a EDP, empresa portuguesa de geração de energia, que é uma das controladoras, junto com o grupo Rede, vem tentando uma parceria com a empresa Furnas. Então, que planejamento é esse que não leva em consideração os problemas ambientais, os limites orçamentários do estado e os próprios interesses imediatos de setores importantes do governo brasileiro? 
24 de setembro de 2003
Mayron régis 

PEC do Cerrado: uma tentativa de corrigir a omissão com os biomas brasileiros. Entrevista especial com Mauro Pires

      


“Não é razoável que uma matéria dessa importância fique mais de 20 anos sem tramitação no Congresso Nacional”, adverte o sociólogo.
 Foto: i1.r7.com
A PEC do Cerrado, que tramita no Congresso há quase 20 anos, “procura sanar uma grave omissão do texto Constitucional de 1988” em relação à preservação dos biomas brasileiros, diz Mauro Pires, em entrevista por e-mail à IHU On-Line.
Segundo ele, quando a Constituição foi elaborada, “a Amazônia estava literalmente em chamas, com extensos incêndios e desmatamentos, o que chamou a atenção internacional. A Mata Atlântica, por sua vez, estava ainda num ritmo de destruição igualmente intenso e o Pantanal já era conhecido como um bioma especial. Portanto, os Constituintes consideravam normal incluí-los mais a Serra do Mar como patrimônio nacional, mas deixaram de fora os demais biomas”. Assim, a PEC propõe que os Pampas, o Cerrado e a Caatinga sejam incluídos na categoria de patrimônio nacional.
Pires menciona que o Cerrado sempre foi visto com preconceito, como um “bioma de menor importância”, e desde os anos 1970 as propagandas o apontam como “o celeiro do mundo”.
Durante esses 20 anos, comenta, a aprovação da PEC sempre sofreu a “resistência de setores muito fortes politicamente, com representação nos mais variados partidos, receosos de que tal aprovação possa implicar eventual prejuízo ao agronegócio”. Contudo, adverte: “Não é nada disso. No Cerrado, é possível continuar a produção, mas é fundamental que parte de suas áreas sejam conservadas e preservadas, pois, do contrário, a própria agropecuária será prejudicada”. Mauro Pires salienta ainda que o Cerrado “é considerado o berço das águas” e deve ser conservado, considerando que “estamos assistindo a crises hídricas em vários cantos do país”.
Mauro Pires é sociólogo e ex-diretor do Departamento de Prevenção e Controle do Desmatamento do Cerrado do Ministério do Meio Ambiente.
Confira a entrevista.
Foto: www.observatorioflorestal.org.br
IHU On-Line - Em que consiste a PEC do Cerrado, que eleva o Cerrado e a Caatinga à condição de patrimônio Nacional? O que muda em relação ao Cerrado e à Caatinga caso a PEC for aprovada?
Mauro Pires - A PEC que tramita atualmente foi apresentada em 1995, pelo então Deputado Pedro Wilson, de Goiás e, portanto, está prestes a completar 20 anos sem ter sido aprovada. Se considerarmos que o ex-deputado Fabio Feldmann (São Paulo) também havia submetido proposta de igual teor por volta de 1992, o tempo é maior. Tanto a proposta de Feldmann, restrita ao Cerrado, quanto a de Pedro Wilson, que inclui além do Cerrado, a Caatinga e, posteriormente, o Pampa, procuram sanar uma grave omissão do texto Constitucional de 1988. Na época da Constituinte, que ocorreu entre 1986-1988, a Amazônia estava literalmente em chamas, com extensos incêndios e desmatamentos, o que chamou a atenção internacional.
A Mata Atlântica, por sua vez, estava ainda num ritmo de destruição igualmente intenso e o Pantanal já era conhecido como um bioma especial. Portanto, os Constituintes consideravam normal incluí-los mais a Serra do Mar como patrimônio nacional, mas deixaram de fora os demais biomas. Sobre o Cerrado, sempre houve o preconceito de que se tratava de um bioma de menor importância, afinal suas árvores tortas não chamavam a atenção. De outro lado, com avanço tecnológico, suas terras passaram a ser vistas como promissoras para o desenvolvimento agropecuário, notadamente de monoculturas e pecuária bovina. Desde os anos 1970, havia uma propaganda apontando o Cerrado como o “celeiro do mundo”. Portanto, subliminarmente ou às vezes até mesmo explicitamente havia aqueles que defendiam que não precisava ser preservado. Outra tese curiosa era de que era preferível desmatar o Cerrado em vez da Amazônia.

 “Outra tese curiosa era de que era preferível desmatar o Cerrado em vez da Amazônia”

Portanto, as PECs pretendem corrigir essa omissão ao reconhecerem a importância desses demais biomas brasileiros. Torná-los patrimônio nacional significa que o nosso país valoriza a sua riqueza natural (única no mundo), a sua biodiversidade, a fauna e flora e toda a cultura das populações que fazem uso do Cerrado, da Caatinga e dos Pampas. O Brasil poderá demonstrar ao mundo que cuida de toda a sua natureza. Quando forem reconhecidos como patrimônio nacional, esses biomas poderão ser objeto de mais atenção do poder público e receber mais recursos governamentais e privados para a sua conservação e o uso sustentável. Será possível ampliar os esforços da sociedade civil, por exemplo, da Rede Cerrado de ONGs, criada em 1992, exatamente para chamar a atenção pública para a importância socioambiental do Cerrado e o elevado índice de destruição que vem sofrendo.
IHU On-Line - Por quais razões a PEC do Cerrado e Caatinga deixa de fora o bioma Pampa, no Rio Grande do Sul?
Mauro Pires - Como dissemos acima, essa exclusão foi corrigida e atualmente a proposta inclui tanto o Cerrado quanto a Caatinga e o Pampa. Mas é fundamental que seja aprovada. Não é razoável que uma matéria dessa importância fique mais de 20 anos sem tramitação no Congresso Nacional. Por diversas vezes, nós nos mobilizamos para sua aprovação ao longo desse período, mas sofremos resistência de setores muito fortes politicamente, com representação nos mais variados partidos, receosos de que tal aprovação possa implicar eventual prejuízo ao agronegócio. Não é nada disso. No Cerrado, é possível continuar a produção, mas é fundamental que parte de suas áreas sejam conservadas e preservadas, pois, do contrário, a própria agropecuária será prejudicada. Se não cuidarmos das nascentes, se não diminuirmos o assoreamento dos rios, se não diminuirmos o desmatamento, os serviços ecossistêmicos gratuitamente ofertados pelos biomas brasileiros cessarão e a agricultura poderá se inviabilizar.
 Foto: www.sabordocerrado.com.br
IHU On-Line - O que torna, ou seja, quais características fazem com que um determinado bioma ganhe status de patrimônio nacional e outros não?
Mauro Pires - Não há um critério objetivo. Na verdade, até onde apuramos (iniciamos uma pesquisa na Sociologia da UnB a respeito), durante a Constituinte houve até algumas propostas de parlamentares procurando incluir ao menos o Cerrado no capítulo de meio ambiente da Constituição, mas essas não entraram na fase de sistematização e finalização do texto. Como dissemos acima, havia um certo preconceito, que ainda persiste, de que o Cerrado não é belo, não é útil e, portanto, pode ser destruído e ceder suas áreas às extensas monoculturas e pastos. No caso da Caatinga e dos Pampas, eu diria que o preconceito é idêntico.
IHU On-Line - Quais os resultados concretos do status de patrimônio nacional, além da captação de recursos?
Mauro Pires - Concretamente, hoje nós temos biomas de primeira e de segunda categoria, o que é inadmissível. Quando todos se tornarem patrimônio nacional, isso acabará. Poderemos iniciar uma grande campanha de valorização dos biomas; poderemos ampliar a fiscalização ambiental a ser feita pelos órgãos ambientais. As propostas de criação de áreas protegidas (unidades de conservação) serão mais fortalecidas, bem como as propostas de investimentos em uso sustentável. O prof. Donald Sawyer, do ISPN, ao longo de décadas vem se dedicando ao conceito de paisagens produtivas sustentáveis, especialmente no Cerrado, que procura alinhar práticas de produção com a conservação ambiental e a manutenção dos serviços ecossistêmicos. Se esse bioma for elevado à condição de patrimônio nacional, poderemos batalhar para que esse conceito seja expandido e, fundamentalmente, praticado na atividade agropecuária atual.
IHU On-Line - Quais são os grupos que apoiam e os que são contrários à PEC? Quais são os principais pontos de divergência e os argumentos que cada grupo sustenta?
Mauro Pires - Os grupos que apoiam a PEC são as entidades como a Rede Cerrado de ONGs, os movimentos sociais, os indígenas, os trabalhadores rurais, as populações tradicionais, a academia e alguns membros do governo. Os seus argumentos são de que é necessário valorizar todos os biomas, valorizar a riqueza natural e social imbricadas nos biomas. Consideram que a condição de patrimônio nacional é uma importante luta em favor da conservação ambiental. Entre os que são contrários, estão a bancada ruralista e seus representantes no governo. O seu temor é de que a condição de patrimônio nacional prejudique o agronegócio e venha a limitar a expansão do desmatamento. Nós temos debatido com eles que essa tese é equivocada. Se não houver o engajamento dos proprietários rurais, realmente o Cerrado perecerá, estando os poucos remanescentes limitados às pequeninas manchas presentes nas unidades de conservação que, vale dizer, estão longe de representar um bioma que originalmente cobria 25% do território brasileiro. Nós acreditamos, assim, que os proprietários devem ser agentes da conservação.
IHU On-Line - Que alianças seriam necessárias para que a PEC fosse aprovada? Concorda com opiniões de que seria necessário uma aliança com a bancada nordestina? Por quê?
Mauro Pires - Sim. Na verdade, essa aliança já foi realizada algumas vezes. Por exemplo, em 2006, quando estávamos à frente do Núcleo Cerrado e Pantanal do MMA, procuramos alguns deputados, entre eles o Carimbão, de Alagoas, o Dutra, do Maranhão, que ajudaram na aprovação da PEC na Comissão Especial destinada à sua análise, apesar da resistência do deputado relator, que era do Mato Grosso. Precisamos, sim, ampliar essa aliança, o que é tarefa para todos os segmentos. Vamos esperar que com a nova legislatura, que se iniciará em fevereiro de 2015, juntamente com o governo que sairá das urnas, seja possível novamente uma grande mobilização nacional em favor dos biomas esquecidos.

 “Entre os que são contrários, estão a bancada ruralista e seus representantes no governo”

IHU On-Line - Além da aprovação da PEC do Cerrado, que outras medidas seriam necessárias para garantir a manutenção da vegetação nativa e preservar o bioma?
Mauro Pires - Claro. A PEC é apenas uma parte da luta. É fundamental implementar o PPCerrado, que é o plano do governo federal para diminuir as queimadas e o desmatamento no Cerrado. É igualmente necessário que os governos estaduais e os municípios também se envolvam em ações de conservação e proteção do Cerrado, da Caatinga e dos Pampas. Aliás, com a LC 140, de 2011, os governos estaduais receberam mais atribuições em matéria ambiental e, portanto, sua participação nessa agenda é essencial. Além disso, é fundamental que os proprietários rurais cumpram ao menos o que determina o Novo Código Florestal, registrando os imóveis rurais no Cadastro Ambiental Rural, e iniciando a recuperação dos passivos ambientais. O governo deve agilizar os mecanismos que beneficiam a conservação, como o pagamento por serviços ambientais, as cotas de reservas ambientais, previstas nesse Código Florestal, bem como trabalhar para expandir o número de unidades de conservação nos biomas, muitíssimo abaixo do que estabelecem as Metas de Aichi.
IHU On-Line - Qual é o principal interesse econômico em explorar o Cerrado brasileiro?
Mauro Pires - O principal interesse econômico no Cerrado é sua ocupação agropecuária, baseada, sobretudo, em monoculturas e pastos para a pecuária bovina. O Cerrado está conectado às principais cadeias das commodities globais. Há vários grupos estrangeiros que passaram até mesmo a adquirir terras em suas áreas, como, por exemplo, no Oeste da Bahia. Portanto, o agronegócio na região é o principal motor. Infelizmente, essa ocupação vem sendo feito sem critérios e baseada no desmatamento e nas queimadas.
IHU On-Line - Que percentual do Cerrado já é ocupado pela agricultura e agropecuária? Quais as consequências dessa ocupação? É possível mensurar qual tem sido o ritmo de devastação do Cerrado?
Mauro Pires - Para a Amazônia, o INPE e a Embrapa desenvolvem o sistema TerraClass, que mapeia o uso das áreas desmatadas e, portanto, permite saber quanto dessas áreas são ocupadas pela agropecuária. No Cerrado, infelizmente, sequer temos um sistema anual e permanente de monitoramento do desmatamento. O que há, entretanto, é um projeto de monitoramento feito pelo IBAMA para todos os biomas extra-amazônicos. Esse projeto de monitoramento indica que quase metade do Cerrado já foi desmatada até 2010. Portanto, as consequências disso são a perda da biodiversidade, o assoreamento dos rios, as emissões de gases de efeito estufa, a perda de território por parte das comunidades tradicionais. Isso leva a crises hídricas, ao encarecimento dos produtos agropecuários, ao aumento, portanto, do custo de vida.

 “O Cerrado é considerado o berço das águas, pois suas nascentes correm para as bacias do Paraguai, Paraná (Prata), do Araguaia-Tocantins, do Xingu, do São Francisco e do Parnaíba”

IHU On-Line - É possível conciliar o desenvolvimento da agricultura e da pecuária com a preservação do Cerrado?
Mauro Pires - Acreditamos que sim. Se aproveitarmos bem as áreas já abertas, é possível expandir a produção agropecuária sem necessidade de aumentar o desmatamento no Cerrado.
IHU On-Line - Qual a influência do Cerrado na distribuição de água para os estados brasileiros? Por que a relevância do Cerrado não é levada em conta quando se fala em crise de abastecimento, por exemplo?
Mauro Pires - O Cerrado é considerado o berço das águas, pois suas nascentes correm para as bacias do Paraguai, Paraná (Prata), do Araguaia-Tocantins, do Xingu, do São Francisco e do Parnaíba. A sua vegetação e o seu sistema radicular funcionam como verdadeiras esponjas de água. Quando é desmatado, essa função é dizimada, comprometendo a vazão e a disponibilidade hídrica. Por isso, o Cerrado deveria ser levado a sério. Já estamos assistindo a crises hídricas em vários cantos do país. Se não cuidarmos do Cerrado, isso tenderá a se ampliar.

DESMATAMENTO IRREGULAR AMEAÇA NASCENTES DE ÁGUAS DA TERRA APINAJÉ

Desmatamento irregular na fazenda Góes, entorno da Terra Apinajé, no município de Tocantinópolis (TO). (foto: Antônio Veríssimo. Set. 2014)

Desmatamentos no entorno da Terra Apinajé, comprometem
nascentes de águas. (foto: Antonio Veríssimo. Set. 2014)
       Movido por interesses econômico e influenciado por teses políticas o Instituto Natureza do Tocantins-NATURATINS mais uma vez ignorou as leis e extrapolou sua própria competência emitindo licenças para desmatar o entorno da Terra Indígena Apinajé, sem informar e/ou notificar a Fundação Nacional do Índio-FUNAI e o Instituto Nacional do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis-IBAMA. A Licença Ambiental para desmatar foi expedida em favor de Eloísio Flávio Andrade proprietário da Fazenda Góes,  localizada próxima (vizinha)  a Terra Indígena Apinajé  no município de Tocantinópolis, no Norte do Estado do Tocantins.
           A Constituição Federal em seu Art. 225 diz: Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para às presentes e futuras gerações.
        § 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incumbe ao poder público:
I – preservar e restaurar os processos ecológicos essenciais e prover o manejo ecológico das espécies e ecossistemas;
II – preservar a diversidade e a integridade do patrimônio genético do País e fiscalizar as entidades dedicadas à pesquisa e manipulação de material genético;
III –definir em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus componentes a serem protegidos, sendo a alteração e supressão permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção;
IV - exigir na forma da lei, para instalação de obra ou atividades potencialmente causadora de significativa degradação do meio ambiente, estudo prévio de impacto ambiental, a que se dará publicidade;
V – controlar a produção, a comercialização e o emprego de técnicas, métodos e substâncias que comportem riscos para a vida, a qualidade de vida e o meio ambiente;
VI – promover a educação ambiental em todos os níveis de ensino e a conscientização pública para preservação ambiental;
VII – proteger a fauna e a flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que coloquem em riscos sua função ecológica, provoquem a extinção de espécies ou submetam os animais a crueldade.
Nascentes de ribeirões da Terra Apinajé, ameaçadas pelos
desmatamentos e plantações de eucaliptos. (foto: Edmar 
Xavito Apinagé. Out. 2013)
    Nos Termos da Constituição Federal do Brasil, o Instituto Natureza do Tocantins-NATURATINS postergou e infringiu a Lei autorizando empreendimentos potencialmente impactantes com efeitos diretos sobre o Território e a vida da população Apinajé. O desmatamento também está sendo implantado de forma irregular sem os devidos Estudos de Impacto Ambiental-EIA e consultas à comunidade Indígena.
       Advertimos que a fauna, a flora e as nascentes dos ribeirões que banham as aldeias São José, Cocal Grande e Prata estão seriamente comprometidos por esse desmatamento que está sendo levado a diante com uso de tratores e correntes. A população indígena teme a poluição do ar, das águas e do solo, pelo uso do veneno e/ou produtos tóxicos usados nas plantações de eucaliptos, soja e outros. Podendo ocorrer também assoreamentos de córregos, diminuição das águas e seca total das nascentes desmatadas.
         Diante desse flagrante de crime e violação de nosso direito ambiental requeremos da FUNAI/CTL de Tocantinópolis, FUNAI/CR de Palmas (TO), CGLIC/BSB, MPF-AGA e IBAMA, providências imediatas para interditar esses desmatamentos ilegais, bem como a punição na forma da lei, das pessoas e/ou empresas responsáveis por esses crimes ambientais.


Terra Indígena Apinajé, 26 de setembro de 2014



Associação União das Aldeias Apinajé-PEMPXÀ

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

A política atrasada do eucalipto em Urbano Santos e Baixo Parnaíba





É muito fácil entender que as plantações de eucaliptos no município de Urbano Santos e em todo Baixo Parnaíba Maranhense encabeçada pela empresa multinacional “Suzano Papel e Celulose” é uma política atrasada em comparação com a nossa tradicional agricultura familiar praticada desde tempos bem remotos. A Suzano representa em seus mares de eucaliptos o capitalismo selvagem que abusa das comunidades tradicionais em nossa região; já agricultura familiar prega em seu bojo o desenvolvimento rural sustentável, decerto não nos alimentamos de eucaliptos, de fato, comemos arroz, feijão, melancia, abóbora, quiabo; bebemos suco de bacuri e gostamos de pequi. O desenvolvimento sustentável na segurança alimentar é o caminho para uma sociedade mais justa e consciente sempre na proteção do meio ambiente e dos recursos naturais. O sistema neoliberal que utiliza de sua força capital para oprimir os trabalhadores rurais, estes são liderados pelos setores conservadores de latifundiários e grupos empresariais onde na verdade nunca fizeram nada pelas comunidades que lutam há séculos por uma Reforma Agrária de verdade.
O município de Urbano Santos é pólo da Suzano desde a década de 80, a maioria das terras pertence a ela e são utilizadas para a plantação desses monstros verdes onde até os passarinhos recusam adentrar nessas áreas sem respiração. Muitos são os conflitos registrados na zona rural de Urbano Santos envolvendo associações e a Suzano. Lembro que a parir do ano de 2001 até 2008, as comunidades estavam no fogo da luta contra o agronegócio; foram várias reuniões com o apoio das entidades em defesa dos direitos humanos realizando encontros e seminários incluindo até marchas e tomadas de estradas para chamar a atenção dos órgãos competentes e da mídia com o intuito de mostrar a realidade do avanço do eucalipto e da soja não apenas em Urbano Santos mas em muitos outros municípios da Região do Baixo Parnaíba. Essa luta em defesa da vida e das questões ambientais tendo como precursor o movimento social do município de Urbano Santos ganhou popularidade com poucos dias depois que a antiga Florestal LTDA chegou e se instalou por aqui, como podemos citar por exemplo a “Ação popular das CEBs nas derrubadas dos fornos da Empresa Maflora instalada no Povoado Juçaral no início dos anos 90”. Em 1992, a Paróquia Nossa Senhora da Natividade de Urbano Santos com a orientação da Diocese de Brejo em nome da CPT organizaram as CEBs (Comunidades Eclesiais de Bases) e outros associações de moradores do município e lugares vizinhos para a realização do histórico e importante “I Congresso de Trabalhadores em Defesa do Baixo Parnaíba” com o lema “Terra, vida, trabalho e Reforma Agrária”. Temas esses que nos faz refletir hoje em dia sobre o calor e otimismo das lideranças daquela época em se preocupar com o progresso das comunidades e combater os sistemas que assolam os camponeses, esse evento ficou para a história. Hoje as comunidades e os movimentos sociais na Região do Baixo Parnaíba talvez não tenha mais o mesmo pique daquelas atividades realizadas na época, mas mesmo assim devemos alimentar a ideia de que os trabalhadores são os verdadeiros donos da terra. A terra é para plantar alimentos: mandioca, milho, maxixe... em fim... a terra é nossa mãe, sem ela não conseguiremos viver; o eucalipto não é daqui, a Suzano não sabe e nem sente as dores e muito menos nunca supriu as necessidades de nossa população, uma vez que seu imenso patrimônio lucrativo fica apenas nas mãos de seus funcionários  e gerentes de negócios.
As terras de Urbano Santos é para fins de Reforma Agrária de nossas comunidades que estão esperando por arrecadações e titulações há décadas, quase cansadas, queremos a distribuição da terra! Essa política atrasado da plantação de eucaliptos nunca fez nada pelo nosso povo, pelo contrário causou conflitos, secou rios, riachos e mananciais, expulsou os animais de seus habitats naturais, desacatou os direitos humanos cercando até cemitérios. Isso basta! Sonhamos ainda com o reflorestamento de nossas chapadas, com a produção de alimentos da agricultura familiar que assegura mais de 65% do alimento que vai para nossas mesas, precisamos lutar em favor da vida, precisamos sonhar com um mundo melhor para os menos favorecidos representados por aqueles que sempre tiveram seus direitos negados: homens e mulheres trabalhadores e trabalhadoras do campo, com todo esse romantismo concreto recordo conscientemente do lema do “9º Fórum Social Mundial” que aconteceu em Belém-PA, do qual estive presente, servindo como luva para esta causa, o mesmo dizia: “UM OUTRO MUNDO É POSSÍVEL”.
 
José Antonio Basto
23/09/2014
 - Militante dos Direitos Humanos
(98) 8890-4162